Acabo de viver um momento único, o nascer duma democracia. Tenho de confessar que foi por acaso que tropecei no momento que vos vou descrever, pois ia a caminho da loja do staff aqui na ilha quando me deparei com a urna dos votos, uma caixa transparente com uns 60x60x60cm selada, com abraçadeiras largas no meio da sala de diversões do staff. Hoje não havia nem ping-pong nem snooker para ninguém, mas eu era o único a reparar nisso.
Com aquela sensação de quem entrou num sítio proíbido, desloco-me para o fundo da sala para entrar na loja rapidamente quando o Zaheem me chama: “Paulo...the shop is closed”. Afinal só abria às 20h30 e ainda eram 20h10. Aproveitei a dica para lhe perguntar o que iam fazer com a urna. Ah, vão abri-la às 21h00, contar os votos e depois comunicar para Male. O.K., digo eu, então voltarei depois. Escusado será dizer que voltei à loja pelas 20h55.
Com uma garrafa de água de 1,5l, uma pasta colgate active salt e um desodorizante de marca desconhecida nas mãos, reparo que a abertura da urna é um processo público. Começam a cortar as abraçadeiras, abrem a urna e começam a tirar os votos um a um, mostrando para o “público” presente e separando por 3 pilhas, a saber: presidente/ditador em exercício, opositor da coligação e nulos/brancos.
Dizem que não posso tirar fotos, pelo que me desloco para trás da audiência que assiste ansiosa à contagem. Ao fundo da sala alguém deixou um jogo da psp3 a correr e ainda uma televisão com o noticiário local. Aproveito a minha invisibilidade para tirar algumas fotos sem flash, algo que me irão perdoar certamente, dada a importância histórica do acto. Assim que o último voto é mostrado, todos batem palmas felizes por terem podido determinar algo pela primeira vez nas suas vidas.
Existe uma tensão que se respira no ar quando a contagem realmente começa e o resultado é comunicado: 81 votos para o opositor, 21 votos para o presidente em exercício. A juventude dos staff que aqui trabalha dita o resultado em prol duma mudança por algo que nenhum deles me sabe bem explicar, mas que é uma baforada de ar fresco depois de 30 anos do mesmo. Os resultados das Maldivas inteiras só se saberão noite dentro, mas este espírito de poder fazer a diferença é algo de único.
Não sei se o opositor irá ganhar, e mesmo ganhando, se este entusiasmo todo terá retorno no dia-a-dia das vidas dos maldivanos, mas a hipótese de ter presenciado o nascimento da democracia num povo que quer comandar os seus destinos, em vez de ser comandado, é algo que nunca esquecerei. Obrigado meus amigos maldivanos, por me terem deixado presenciar, como se um de vós fosse, este parto. Que sejam felizes!
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