Como falar do meu Tio Joaquim? Um poço de vivências? Um homem sempre bem disposto? Um trabalhador incansável para si e para os seus? Alguém que dava sempre sem nunca esperar nada?
Era tudo isso e muito mais. Desde pequeno que nas festas de família me habituei a ouvir sempre uma anedota ou uma história real (por vezes era difícil distinguir) a propósito de algo. Bastava alguém falar sobre um acontecimento que o Tio Joaquim dizia logo: “isso faz-me lembrar...”. E acabávamos todos a rir.
Pude trabalhar com ele durante 2 anos, ele no final da sua vida de trabalho e eu no início da minha. Com 65 anos carregava um móvel sozinho como se fosse de papel. O seu tamanho? Pouco mais de 1,60m.
Ouvir as histórias da sua vida de taxista em São Paulo na década de 50 e 60 era algo que me deliciava em criança. E até em adulto, quanto mais em criança.
Partilho convosco esta conversa com ele a propósito da vida de hoje em dia:
“Não percebo, dizia ele. As pessoas queixam-se que a gasolina está cara, mas contudo vão de carro para o trabalho e perdem mais de uma hora para lá chegar. Depois como não fazem nada o dia todo, vão para ginásios correr onde também têm de pagar. Eu trabalhava no Cais do Sodré e ia desde Odivelas a pé todos os dias. Duas horas para lá e duas horas para cá. Todos os dias, Verão ou Inverno, sol ou chuva. Acham que gastava dinheiro em gasolina ou em ginásios? Não que o tivesse, claro. E estava em forma que era um regalo! O tempo que demorava era praticamente o mesmo que hoje em dia somando o carro com o ginásio. Sinceramente, não percebo!”
Estas conversas com ele eram sempre fascinantes, fosse sobre alhos ou bogalhos. Lembro-me que, até nos velórios e nos funerais, era sempre ele que transformava aqueles momentos infinitos de dor e desconforto em momentos em que me sentia orgulhoso por fazer parte da minha família. Ele tinha sempre uma história ou um acontecimento sobre o morto que fazia todos rirem e sorrirem felizes por terem partilhado aqueles momentos com a pessoa a ser velada. Até na morte ele via razão para celebrar a vida.
Recordo com carinho quando o levei a comer um belo peixe em Porto Brandão há 2 anos. Sabia que a saúde dele não o deixaria estar entre nós durante muito tempo, pelo que foi a minha singela maneira de lhe dar um bocadinho de felicidade que nunca seria a mesma que ele me deu. Chegados lá, ele quis comer uma feijoada à brasileira, pois tinha saudades e por causa da diabetes nunca comia. Foi um almoço simples, de gente simples, mas que eu sabia que seria a última refeição que eu partilharia com ele naquele ambiente leve e de quem está de bem com a vida. Momentos que estão no meu coração como tantos outros.
Agora chegou a sua vez de partir e não estará ninguém para fazer rir a família e para relembrar que ele era o exemplo vivo de como a vida é algo de maravilhoso. Enfrentou mil adversidades, nunca deixou de ser pobre e humilde, mas era um poço de alegria e felicidade para todos aqueles que tiveram a felicidade de o conhecer. Um exemplo que espero nunca esquecer na minha vida.
Sempre que me lembrar de ti, Tio, fá-lo-ei com um sorriso que agora não consigo esboçar.
Adeus meu velho!
Adeus meu velho!
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
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