Adeus meu velho!

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Como falar do meu Tio Joaquim? Um poço de vivências? Um homem sempre bem disposto? Um trabalhador incansável para si e para os seus? Alguém que dava sempre sem nunca esperar nada?
Era tudo isso e muito mais. Desde pequeno que nas festas de família me habituei a ouvir sempre uma anedota ou uma história real (por vezes era difícil distinguir) a propósito de algo. Bastava alguém falar sobre um acontecimento que o Tio Joaquim dizia logo: “isso faz-me lembrar...”. E acabávamos todos a rir.
Pude trabalhar com ele durante 2 anos, ele no final da sua vida de trabalho e eu no início da minha. Com 65 anos carregava um móvel sozinho como se fosse de papel. O seu tamanho? Pouco mais de 1,60m.
Ouvir as histórias da sua vida de taxista em São Paulo na década de 50 e 60 era algo que me deliciava em criança. E até em adulto, quanto mais em criança.
Partilho convosco esta conversa com ele a propósito da vida de hoje em dia:
“Não percebo, dizia ele. As pessoas queixam-se que a gasolina está cara, mas contudo vão de carro para o trabalho e perdem mais de uma hora para lá chegar. Depois como não fazem nada o dia todo, vão para ginásios correr onde também têm de pagar. Eu trabalhava no Cais do Sodré e ia desde Odivelas a pé todos os dias. Duas horas para lá e duas horas para cá. Todos os dias, Verão ou Inverno, sol ou chuva. Acham que gastava dinheiro em gasolina ou em ginásios? Não que o tivesse, claro. E estava em forma que era um regalo! O tempo que demorava era praticamente o mesmo que hoje em dia somando o carro com o ginásio. Sinceramente, não percebo!”
Estas conversas com ele eram sempre fascinantes, fosse sobre alhos ou bogalhos. Lembro-me que, até nos velórios e nos funerais, era sempre ele que transformava aqueles momentos infinitos de dor e desconforto em momentos em que me sentia orgulhoso por fazer parte da minha família. Ele tinha sempre uma história ou um acontecimento sobre o morto que fazia todos rirem e sorrirem felizes por terem partilhado aqueles momentos com a pessoa a ser velada. Até na morte ele via razão para celebrar a vida.
Recordo com carinho quando o levei a comer um belo peixe em Porto Brandão há 2 anos. Sabia que a saúde dele não o deixaria estar entre nós durante muito tempo, pelo que foi a minha singela maneira de lhe dar um bocadinho de felicidade que nunca seria a mesma que ele me deu. Chegados lá, ele quis comer uma feijoada à brasileira, pois tinha saudades e por causa da diabetes nunca comia. Foi um almoço simples, de gente simples, mas que eu sabia que seria a última refeição que eu partilharia com ele naquele ambiente leve e de quem está de bem com a vida. Momentos que estão no meu coração como tantos outros.
Agora chegou a sua vez de partir e não estará ninguém para fazer rir a família e para relembrar que ele era o exemplo vivo de como a vida é algo de maravilhoso. Enfrentou mil adversidades, nunca deixou de ser pobre e humilde, mas era um poço de alegria e felicidade para todos aqueles que tiveram a felicidade de o conhecer. Um exemplo que espero nunca esquecer na minha vida.
Sempre que me lembrar de ti, Tio, fá-lo-ei com um sorriso que agora não consigo esboçar.
Adeus meu velho!

Tragédia grega, acto III

Ao chegar aos 10m recomeça a hiperventilar e verifico que desta vez não a vou conseguir acalmar, pois ela começa a demonstrar sinais de pânico e diz que quer vir para a superfície. De imediato faço sinalética ao grupo para nos afastarmos do recife e iniciarmos a subida, pelo que a corrente nos começa a afastar. Agora pensam vocês...ah...grande coisa...tiveste uma cliente que hiperventilou e tiveste de vir para cima. Não meus caros, a coisa ainda fica melhor. Apesar da minha sinalética, o marido continua no recife a fazer fotografia agachado e eu não o posso ir buscar, pois se a largo, ela vai para cima que nem uma flecha. Vejo o marido cada vez mais longe, pois a corrente afasta-nos e penso: “fantástico...tenho agora uma pessoa quase em pânico, estou numa zona com corrente forte e vou perder um mergulhador”. E eis que o bom gigante me auxilia disparando contra a corrente em direcção ao marido (teve de nadar uns bons 25m contra a corrente) e, puxando-o por uma barbatana, diz que está na hora de acabar a sessão de fotografia.
Ao voltarem, estou eu a acabar o patamar de 3min aos 5m tendo de lançar a bóia de sinalização para a superfície com um carreto de modo a que o barco nos veja e nos recolha. Para os que fazem mergulho, sabem que é completamente impossível realizar esta operação com uma mão, pois a outra estava ocupada a agarrar a grega. Abro o bolso, tiro a bóia do bolso, desenrolo-a, mas agora precisava de engatar o mosquetão do carreto e, pela primeira vez na vida, invejei um polvo! Olho para o lado e o marido já lá está, pelo que de imediato levo a mão dela à do marido e espero que eles se entendam. Como não começaram à estalada, decido que posso mandar a bóia para cima e lá subimos devagar até à superfície, altura em que ela tira a máscara e começa a chorar desalmadamente, tendo o marido dito algo que me pareceu grego. Provavelmente era!
Digo “thank you” ao bom gigante sem soltar as palavras da boca, libertando um suspiro por ter sobrevivido à minha primeira discussão conjugal subaquática!

Neve

domingo, 23 de novembro de 2008


Não estava nos planos para já (frase mais proferida por jovens casais!), mas agora que veio vamos aproveitar: é a neve, anunciando o Inverno frio do Norte Europeu...

Tragédia grega, acto II

sábado, 22 de novembro de 2008

Decidi que ir ao naufrágio seria uma bela ideia, pois o bom gigante (ver acto I) já tinha dito que gostava de lá ir um dia.
Mais meia hora de caminho e estávamos lá, no Fesdhu Wreck. Para todos aqueles que não gastaram mil contos (na altura) por semana no britânico, é o naufrágio de Fesdhu :D
Chegados lá, faço a verificação da corrente, que constato existir, mas que é de nível aceitável. Dou indicação ao capitão para posicionar o barco no ponto que quero e saltamos para a água. Posto isto, começamos a descida e constato, que ao invés do que é normal, a corrente a 25m é mais forte que a corrente à superfície, mas estando lá em baixo tínhamos de lidar com ela, pelo que dirijo o grupo para bombordo do naufrágio para ficarmos abrigados da dita.
Enquanto lá estivemos a corrente foi cortada pelo naufrágio que servia de barreira, mas quando foi preciso dar a volta ao naufrágio, a corrente tornou-se mesmo forte, pelo que decidi deixar o naufragio e derivar para um recife por perto deixando-nos levar pela corrente. Deste modo, garantia um mergulho sem esforço, pois bastava controlar a posição vertical na água, sendo a corrente a nossa “barbatana-mor”.
Imaginem o meu espanto quando, ao chegar ao recife, já a 15m de profundidade (menos 10 que no naufrágio), a grega me agarra o braço, entrando em hiperventilação (respiração superficial e ofegante que não oxigena o sangue e dispara o consumo de ar da garrafa). De imediato, dou-lhe a mão agarrando-a e tento acalmá-la, pois se ela passasse dessa fase para o pânico, a coisa poderia tornar-se perigosa, pois tínhamos acabado de vir dos 25m. Entretanto chega o marido preocupado com ela, tendo ela tido uma reacção fabulosa para um casal em lua-de-mel. Começou a bater no marido (ou tentando), repudiando-o e, agarrando-me ainda com mais força, puxou-me para junto dela. Amigos: confesso que os meus anos de experiência em que já vi muita coisa e resolvi muitas situações não me prepararam para isto. Fiquei por uns instantes sem reacção, tal como o bom gigante, até que o marido decidiu deixar-nos e ir fazer umas fotos, pois é grande aficionado da fotografia subaquática.
Recuperado do espasmo cerebral que sofri durante a cena, consigo fazê-la parar de hiperventilar, pelo que continuo o mergulho para a zona mais rasa do recife (10m de profundidade), de modo a precaver situações reincidentes. Se bem o pensei, em boa hora o fiz!
(continua)

Maalhos Thila

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Estas são as fotos tiradas por mim no segundo mergulho depois de Himendhoo (ver posts anteriores).

Espero que gostem :)










































Tragédia grega, acto I

Tragédia Grega

Acordei com a sensação de que seria um dia único. Sim, eu sei que todos os dias são únicos na medida em que nunca se repetem - para os carimbadores de papéis duma qualquer repartição pública posso garantir, apesar do que possam pensar, que isso é um facto para a maioria da população...os meus sentimentos Sras. e Srs. carimbadores – mas este tinha todo o ar de que seria mesmo único. E porquê? Porque mais uma vez ia a dois sítios lindíssimos verificar se as mantas já tinham chegado :D
À medida que chegávamos perto de Himendhoo, Nizar, o capitão de serviço avisa logo que temos corrente W para E, pelo que me preparo para a verificação de corrente. A verificação de corrente consta em saltar do barco só com máscara e barbatanas para ver se o recife está a “viajar” a grande velocidade e em que sentido, ou seja, escolhemos um ponto do recife e somos arrastados pela corrente só vendo o recife a “passar” lá em baixo. Ao melhor estilo “árvores a correr” quando andamos de combóio. Nesse dia era o único instrutor na água. Só para ficarem com uma ideia da força da corrente, ao entrar na água, as barbatanas foram logo arrastadas ao ponto de, quando a cabeça entrou, já as pernas iam de lado!!! Tento fixar um ponto no recife, mas era escusado, pois sou arrastado a uma velocidade tremenda para dentro do Atoll, pelo que mergulhar ali estava fora de questão. Pois bem, mudança de planos. Vamos mergulhar a um naufrágio dentro do Atoll onde deverá estar mais calmo, sendo que mantas naquele dia só no sofá.
Comigo viajam um casal grego e um alemão de 2m de altura, um bom gigante. Já tendo mergulhado com todos os presentes, sei que são mergulhadores confortáveis, mas não excepcionais, pelo que um local mais abrigado é sem dúvida muito melhor opção. Mal sabia eu o que me esperava!

(continua)

Pézinhos de lã

domingo, 16 de novembro de 2008


Não sei se é por causa do frio, da humidade, da chuva ou dos diques, mas parece ser hábito em algumas casas holandesas o descalçar-se à entrada.

Na primeira casa onde estive, a do venerável chino-holandês Yon, descalçar os sapatos à entrada era regra. Ora, não se podendo dizer que a casa primasse pela limpeza geral (Yon, moço solteiro e bom rapaz que, como tal, tinha outras prioridades tais que não a limpeza do chão), decidi um dia não me descalçar à entrada, porque me irritavam solenemente as partículas que se agregavam às minhas meias. Naturalmente, mereci o reparo:

- Hey, you should take out your shoes...
- But the floor needs to be cleaned up, respondi.
- Yes, but there's no need to bring more dirt inside!

Sim, o mais provável era levar a dirt out! Mas pronto, um gajo tem de se calar...

Quando me mudei de casa, para a do simpático Surinamense Armand, ainda estavam a acabar de colocar o chão de madeira, pelo que havia farelo e pó um pouco por todo o lado:

- Hey Rafael, you'd better take out your shoes...

Nem respondi, corri logo para a entrada a descalçar-me.

Apesar do farelo, a parte verdadeiramente cómica estava para vir. Batem à porta dois simpáticos senhores, holandeses de seu robusto metro e noventa, munidos do seu fato-macaco oleoso e de bloco de notas em riste, técnicos não-sei-do-quê. Impressionado pelo aspecto profissional e porte altivo dos ditos, confesso que a desilusão foi profunda quando reparei que também eles exibiam umas meigas peúgas multicolores, quase fofas, como diria uma ex-aluna minha, em detrimento das másculas botas de biqueira de aço, deixadas à entrada...

A imagem das pegadas dos mastodontes no farelo dificilmente me sairá da memória...!

P.S.: Hoje já estou noutra casa, que espero definitiva - não se descalçam os sapatos à entrada. A quem possa interessar, aqui fica um par de utensílios que podem ajudar a contornar esta questão - resolve a questão psicológica e limpa!

Himendhoo, parte 3

sábado, 15 de novembro de 2008

Eis as últimas fotos deste mergulho, sendo que a última é da extremidade do Atoll, depois disto é África :D














Sandbank

terça-feira, 11 de novembro de 2008



Imaginem um mar azul imenso. Agora imaginem que desse mar azul e transparente sai um pequeno banco de areia branca e fina com 10x10m rodeado de corais. Estão a imaginar bem? Não é preciso, têm a foto :D Pois bem, isso é o que por aqui se chama o sand bank e que é alugado por 3 horas pela módica quantia de 360 dólares.
Um casal do Dubai em lua-de-mel (muito original por estas bandas) alugou o dito banco de areia, pelo que era necessário ir prepará-lo, ou seja, colocar chapéu-de-sol, cadeiras, toalhas e uma geleira com as coisas que eles tinham encomendado. E foi assim que dei por mim a brincar com os pés na areia fina e molhada, enterrando-os e desenterrando-os enquanto abraçava uma nova carreira: a de segurador de barco. E o que faz um segurador de barco, perguntam vocês? Um segurador de barco, por incrível que pareça, segura o barco que foi enfiado areia dentro, de modo a que este não desatraque, enquanto o seu colega varre o banco de areia de coisas esteticamente desagradáveis como pauzinhos e palhinhas, de modo a deixar a areia com aspecto idílico.
E foi neste cenário que dei por mim a pensar: “estás aqui no meio do paraíso a segurar um barco com dois dedos à proa...brincas com a areia que te desliza entre os dedos, sentes a temperatura cálida destas águas, inspiras, expiras e és simplesmente feliz como uma criança”. A vida pode ser muito simples em certas ocasiões, sem dúvida!
De repente, o Adam dá a sua tarefa por terminada, empurro o barco para dentro de água, salto para dentro e lá vamos nós na lancha rápida a 40 nós buscarmos o dito casal. A vida é, realmente, simples!

Himendhoo, parte 2

sábado, 8 de novembro de 2008

Mais algumas fotos do mergulho em Himendhoo...



















Himendhoo

sexta-feira, 7 de novembro de 2008


Hoje era o meu dia de folga após quase duas semanas de trabalho intenso, devido ao surto de otites de que já vos falei, por isso, quando o Vova me disse ontem que ia à procura de mantas hoje nos mergulhos só me apeteceu bater-lhe. Precisava (preciso) mesmo de descansar, mas se eles vêem mantas nos mergulhos e eu fico a dormir nunca mais me perdoarei, pensei eu.


E assim foi. Fizemos dois mergulhos e mantas nem vê-las, mas pude fazer algo que não fazia há imenso tempo: mergulhar "mesmo"! E qual a diferença entre mergulhar e mergulhar mesmo? Simples: quando mergulho, levo clientes; quando mergulho "mesmo" levam-me a mim e à câmara :D A visibilidade não estava muito famosa devido à imensa quantidade de nutrientes na água, mas mesmo assim o resultado foram horas sem fim a escolher e tratar as fotos, sendo que aqui vou deixando, dia após dia, algumas delas de modo a não fazer um post de 10 páginas.

Espero que gostem :)